Quando criança em idade pré-escolar, Diones Marcio de Souza, 40, morava perto de uma linha de trens na goiana Leopoldo de Bulhões (a 62 km de Goiânia). O menino cresceu, passou oito anos num quartel e se tornou técnico em laboratório, mas nunca esqueceu de suas origens.
A memória afetiva da infância feliz fez com que nos últimos seis anos passasse a viajar até quatro vezes por mês em busca de fotografar trens e paisagens que envolvam trilhos, locomotivas, vagões e estações ferroviárias.
Desde então, acumula um acervo com mais de mil vídeos e ao menos 10 mil fotos, guardadas em HDs externos e com duas cópias de segurança de todos eles.
A intensidade da busca fez com que passasse a ser chamado pelos amigos de “caçador de trens”, apelido que absorveu e que inclusive passou a identifica-lo em redes sociais.
“Quando encontro ferrovia abandonada, dá uma sensação muito ruim ao ver mato em cima dos trilhos, dormentes acabados. Dá um sentimento de derrota, de fracasso, por ver aquilo e imaginar que nunca mais vai ser como já foi um dia”, afirmou.
Nos finais de semana, chega a viajar até 180 quilômetros em busca dos melhores ângulos para fotografar e de cenas inéditas para seu acervo.
Nessa busca, já se deparou com momentos agradáveis, ruins e até mesmo de risco. Num deles, estava filmando uma composição distante cerca de dois quilômetros e percebeu que ela parou.
Estranhou, mas continuou filmando. Como ela não partia, resolveu ir até o local e encontrou os últimos vagões do trem descarrilados, com dormentes e trilhos destruídos.
“O maquinista estava conferindo o estrago e entrando em contato com a concessionária. Eu sabia que não era certo parar ali, mas não imaginei que encontraria o trem nessa situação”, disse.
Em outra, se arriscou para salvar um tatu que estava nos trilhos quando um trem se aproximava.
“Quando vi [o animal], pendurei a máquina no pescoço, corri, grudei no tatu e o tirei da linha. Foi a conta de fazer isso e o trem passou. Ele quase foi morto, e eu corri o risco.”
Em suas aventuras, porém, já encontrou também cenas agradáveis, como um lobo guará no meio dos trilhos durante uma sessão fotográfica. Em outra oportunidade, crianças de seis anos reclamavam com o professor da demora do trem que eles aguardavam. Um dos meninos questionou o grupo se não havia “furado o pneu” da locomotiva. Foi a deixa para o professor explicar como era a operação dos trens.
CELEBRIDADE
Tamanho empenho em fotografar o sistema ferroviário no Centro-Oeste já rendeu fama ao caçador de trens, que é questionado por amigos em redes sociais sobre onde estará, para que outros amantes das ferrovias possam fotografá-lo em ação.
A atividade é desenvolvida meramente por paixão, já que Souza não comercializa as produções que faz.
É simplesmente algo mais forte que eu, algo que trago da infância. Quando fotografo, fico imaginando se aquela será a última vez que farei isso naquele local. Acompanho o declínio do sistema ferroviário com tristeza, não vejo esperança. Quero registrar enquanto é possível.”
Em uma estação conhecida por ele próxima a Goiânia, a destruição já aconteceu. Vândalos levaram bancos, tijolos e destruíram o telhado do local. Dela, só sobrou a lembrança.
Fonte: Folha de SP – Blog Sobre Trilhos