Nos últimos 12 meses, pouco se viu de avanço físico nas obras da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), empreendimento da estatal VALEC, em construção na Bahia. Nas planilhas de custos, porém, a multiplicação dos gastos desconhece paralisações. De agosto de 2013 para cá, a ferrovia baiana viu seu orçamento explodir em quase R$ 600 milhões, segundo dados oficiais obtidos pelo ‘Estado’.
Os oito lotes da obra, que um ano atrás tinham investimento total previsto em R$ 4,335 bilhões, já chegam a R$ 4,904 milhões e, certamente, não devem parar por aí, dada a etapa inicial em que está o empreendimento. Na lista das revisões de orçamento dos 1.022 km de extensão da Fiol, chama a atenção a situação de três lotes. Trata-se do trecho de 320 km que liga o município de Luís Eduardo Magalhães a São Félix do Coribe, além de uma ponte de 3 km de extensão prevista para cruzar o Rio São Francisco. Há um ano, o índice de execução de obras nesses lotes era zero. E no zero os trechos continuam até hoje. Seus custos, no entanto, cresceram R$ 130 milhões nos últimos 12 meses e, agora, já chegam a R$ 1,376 bilhão.
O aumento de gastos estaria relacionado a uma série de fatores: constantes revisões técnicas dos trechos, mudanças de traçado, repactuação de alguns contratos e, finalmente, a saída de empreiteiras de determinados lotes, situação que, se não exigiu a realização de outra licitação, levou a negociações com outras construtoras que tinham participado das concorrências.
A ferrovia baiana vive hoje duas situações distintas. Nos primeiros 500 km que ligam o município de Caetité até Ilhéus, no litoral do Estado, o avanço das obras era de 47% até julho, de acordo com o balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Numa segunda parte de 500 km, porém, que avança até o sertão baiano e chega ao cerrado, na região de Barreiras, não foi feito praticamente nada até hoje – a execução é de apenas 2,81% nas obras.
Desconfiança. As obras da Fiol foram iniciadas pela Valec em 2010 e tinham previsão de conclusão em julho de 2013. Hoje, a estimativa do governo é entregar todo o trecho até abril de 2016, um cronograma que as próprias empreiteiras veem com desconfiança.
No início deste mês, a estatal conseguiu vencer uma etapa que parecia intransponível: a compra de trilhos. Depois de três anos de licitações canceladas e revisadas, finalmente chegou ao porto de Ilhéus uma primeira remessa de 3 mil peças de trilhos fornecidas pela filial espanhola da Arcelor Mittal.
Atualmente, informa a Valec, há cerca de 5 mil trabalhadores espalhados por todos os lotes da ferrovia. Os trechos que até hoje não tiveram obras iniciadas, diz a estatal, estão em fase de mobilização e instalação de canteiros. No lote 7, na região de Barreiras, a primeira ordem de serviço deve ser emitida em uma semana, segundo a Valec.
Ferrovia depende da conclusão de um porto
A viabilidade da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) não se encerra na instalação dos trilhos. A operação da ferrovia depende, fundamentalmente, da conclusão de um porto em Ilhéus, já que seu traçado não foi desenhado para avançar até as instalações portuárias atuais da cidade.
O complexo portuário, que tem orçamento total de R$ 5,6 bilhões, passou os últimos três anos travado em discussões ambientais. Em março deste ano, o empreendimento obteve a licença prévia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o que atesta a sua viabilidade. Há duas semanas, o governo baiano pediu a licença de instalação das obras. A previsão é de que a autorização seja concedida até o início de 2015.
Com área de 1.865 hectares, a implantação do complexo Porto Sul está prevista para a Praia de Aritaguá, em Ilhéus (BA). O governo da Bahia diz que o projeto colocará o Estado em “outro patamar de desenvolvimento”, integrado à ferrovia, e induzirá o crescimento regional.
O complexo será formado pelo Terminal de Utilização Privada (TUP) da Bahia e pelo TUP da Bahia Mineração (Bamin). Está prevista a movimentação de cargas de todos os tipos, de granel a outras mercadorias em várias formas de acondicionamento. Estima-se, no 25.º ano de funcionamento, operar 100 milhões de toneladas anuais.
Poucas obras de infraestrutura enfrentam tantos embates ambientais quanto o porto baiano. Em novembro de 2012, o projeto obteve a licença prévia. Desde então, o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público Estadual (MPE) passaram a contestar a obra. Com a licença prévia nas mãos, o governo baiano corre para implementar os programas básicos ambientais (PBA), divididos em 38 etapas. Trata-se das compensações atreladas aos impactos das obras. Só depois de analisar o cumprimento dos PBAs é que o Ibama decide se concederá ou não a licença da obra.
Os custos socioambientais do Porto Sul ainda não foram detalhados, mas as estimativas preliminares indicam que a conta rondaria R$ 150 milhões. O cronograma já está comprometido. A expectativa do governo baiano era ter iniciado a obras em meados de junho de 2013. Hoje, na melhor da hipóteses, os trabalhos nos canteiros de obras devem começar em 2015.
Muitos lotes da ferrovia passaram anos paralisados por pendências ambientais apontadas pelo Ibama e irregularidades encontradas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Somente em abril deste ano a Valec conseguiu autorização para tocar as obras em todo o traçado. Os atrasos também foram causados por questionamentos de empresas e do TCU sobre as licitações dos trilhos, sob alegação de que elas restringiam a competitividade de interessados.
Em 2013, auditores do TCU chamaram a atenção para outro problema grave: o descolamento entre os cronogramas da ferrovia e do Porto Sul. Há riscos de que os dois empreendimentos fiquem prontos com diferença de até três anos. Ou seja, não haveria por onde escoar a carga transportada. Essa lacuna, segundo o tribunal, pode gerar perdas de até R$ 1,996 bilhão aos cofres públicos.
Fonte: O Estado de S. Paulo